Aflição


Meu caro, por que te agrada tanto julgar teus adversários? Tens frio no estômago – te sentes à vontade, todos temos – ao pensar que em terras nem tão distantes pessoas reuniram-se em teu nome para caluniá-lo. Por que te importas tanto, se fazes o mesmo?

Jovem, na chuva só permanecem secos aqueles acima das nuvens. Tu não hás aprendido a voar ainda, e nunca irás. Como te conheço e te sei: amas o discurso do teto de vidro. Tu deixas que vivam, que pensem, que matem. E ainda assim há mistérios que atormentam teu coração. Assuntos sem sentido. Nunca entendeste por que teus companheiros estudam, trabalham, constroem família. Nunca compreendeste por que gastam tanto em tão pouco tempo. Pra ti, é nos hospícios que vivem os ajuizados. "Vós de fora é que sois loucos. Viveis sob os mandamentos que vós mesmos haveis inventado. E defendestes a liberdade de viver sob eles, loucura!", vociferas esperançoso na multidão silenciosa. Diga-me amigo, o que importa se foste feliz ou triste, se morreste afinal?

Às vezes partilho de tua angústia. Tu és um filósofo aflito, sei que não vês significado nas singelas coisas. Não abstrais motivo algum daqueles que vão à luta por paixão a uma bandeira, num campo de batalha ou num estádio de futebol. Não enxergas o poder daqueles que definem o que deveis e não deveis fazer com vossos corpos. E não sabes por que um supera e outrem não.

Entretanto não são os enigmas alheios que te incomodam mais, são os teus. Por que transferes tua culpa? Ponderas se é algum vício, essa coisa. E por que tens necessidade de responsabilizar o próximo pelo teu sucesso ou pelo teu fracasso?

Sossega esse teu espírito. Pois a única coisa que compreenderás no final desta história é por que vieste. Vieste por que gostas de sofrer.

2 comentários:

  1. Eu me identifiquei muitoo!!!! Choquei!
    Prefiro nao comentar nada sobre o conteúdo... exponho-me, angustiadamente, meus defeitos, medos e desejo pelo inacabado, traiçoeiro, morto, sem graça...

    Sobre a forma... adorei!!!! Os verbos e pronomes rebuscados dão um ar sério e obscuro ao texto. Goste da melancolia conjugada com a razão.

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  2. Pedrinho, me lembrou muito o alienista do mestre Machado de Assis! Mandou muito bem! :-)

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